Saramago
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“A morte é simplesmente a diferença entre o estar aqui e o já não estar." Foi com estas palavras que o Prêmio Nobel de Literatura, José Saramago, numa das muitas entrevistas que concedeu ao longo da vida, definiu o que seria a morte, o ato final de tudo o que é vivo, o destino inexorável de todos nós. Não tinha medo de morrer, mas não escondia seu pesar diante da certeza de um dia já não estar mais aqui. Na mesma entrevista, concedida ao repórter Edney Silvestre em 2007, emprestou da avó Josefa, morta quando ele era ainda um menino, um sentimento que parecia ser agora dele próprio: “O mundo é tão bonito e eu tenho tanta pena de morrer”.
A morte alcançou José Saramago na última sexta-feira, 18 de Junho, aos 87 anos. Sua obra, no entanto, ficará para sempre, como um grande legado seu à humanidade. Além da extensa produção literária, Saramago mantinha o blog Outros Cadernos de Saramago, que o Conversa de Bar se orgulha de manter em sua lista de sites desde seu primeiro dia e continuará a mantê-lo enquanto estiver disponível na rede _ e espero que assim o queira a Fundação José Saramago, responsável pelo sítio. Ao leitor que ainda não o conhecia, fica aqui a sugestão.
5 comentários:
Pois é, Edu, eu também escrevi algo a respeito da morte de Saramago e me sinto igualmente triste. Não o conheci e nunca o vi de perto, mas o mestre de Azinhaga tinha um estilo tão próprio, tão afetuoso, que mais parecia um amigo querido - e foi Saramago um personagem maior do que qualquer um que ele tenha criado.
Diferentemente de boa parte da intelectualidade europeia, ele sentiu na pele o que foi ser pobre, seja pela infância miserável nos campos de Azinhaga, a pobreza em Lisboa onde teve de fazer ensino técnico e se manter como operário, a dificuldade para viver da própria arte - coisa que só conseguiu a partir do 18º livro - e a opressão política: Enquanto boa parte da Europa Ocidental, bem ou mal, estava livre do fascismo desde o fim da guerra, Portugal ainda era um Estado Fascista em plenos anos 70 que, não satisfeito em sê-lo, ainda estava a travar uma insensata e absurda guerra colonial em África. Quando o capitão Salgueiro Maio conduziu em marcha suas tropas do Quartel do Carmo até Lisboa, em Abri de 74, irrompendo a Revolução dos Cravos, Saramago já era um senhor de 51 anos de idade - mais de meio século nascido e amadurecido sob a bota de um regime que juntava o que há de pior em Portugal desde seu surgimento, o provincianismo megalomaníaco e um catolicismo supersticioso que a tudo justifica.
Foi-se a Revolução e os traidores do povo se apoderaram do poder, conduzindo Portugal para o que é hoje, uma unidade periférica da Europa, condenada aos humores e rumores do resto do continente, cujo desenvolvimento se assenta sobre um pântano - e aqui falo tanto de Mario Soares e seus socialistas, que nunca passaram de uma ponta de lança do projeto europeu, e de Cavaco Silva, um social-democrata de araque que Saramago bem classificou como "gênio das banalidades". Foi essa falsa democracia - e Marx há de me advertir que a Democracia sempre foi uma grande encenação teatral, uma tragédia entre os antigos e uma farsa para os contemporâneos - que o perseguiu por razão do seu livro mais pungente, O Evangelho Segundo Jesus Cristo.
O século 20º, aos poucos, nos deixa. O que resta não é bom. Não desprezemos as lições do nosso querido amigo que foi-se, caso quisermos ainda sobreviver.
um abraço
Hugo,
Seu comentário é simplesmente Fantástico! Traz tantas informações e como sempre tão bem escrito que mereceria ser publicado como postagem.
Saramago era um homem muito carismático, pelo menos é essa a impressão que deixava nas suas entrevistas e aparições na TV. Sua morte é uma perda lastimável, mas como diria ele próprio: "o que se há de fazer?"
Abraço!
Só uma correção: É Salgueiro Maia. E como eu te disse lá n'O Descurvo, esteja à vontade para publicar.
abraço
Corrigido, Hugo, passou despercebido.
Obrigado!
Eduardo,
Leio Saramgo por dever de ofício, mas para mim ele é um soluço semântico...
Abs
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